Painel 33 – Políticas públicas, infraestrutura e desenvolvimento em debate na Conferência

São Paulo - A ministra do Superior Tribunal Militar (STM) Maria Elizabeth Guimarães Teixeira Rocha abriu na tarde desta quarta-feira (29) o Painel 33 da XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, cujo tema foi “Políticas Públicas, Infraestrutura e Desenvolvimento”. Ela afirmou que o acesso a serviços básicos – como saúde e educação – estão previstos na Constituição de 1988. 

“Não se tratam de soluções utópicas ou de ideologias”, disse, ressaltando que a inclusão foi uma forma de “garantir a dignidade da pessoa humana, [que] é cláusula pétrea da Carta de 1988”. Maria Elizabeth – primeira e única mulher a presidir (2013-2015) a Corte Militar em seus 209 anos – defendeu a fiscalização de programas sociais do governo pelo Poder Judiciário. “É plenamente possível o controle judicial dos programas governamentais no tocante a sua adequação e conteúdo [jurídico vinculado] à Constituição”, disse. “Cabe ao Poder Judiciário verificar se direitos estão sendo lesados ou ameaçados”, sugeriu Maria Elizabeth.

O painel foi presidido por Mansour Elias Karmouche, presidente da OAB no Mato Grosso, que contou com Marcus Felipe Botelho Pereira como relator e Fabrício Grisi Medici Jurado como secretário. A mesa recebeu como debatedores os advogados Melina Fachin, Marcelo Figueiredo, Luciano de Araújo Ferraz, José Virgílio Lopes Enei e Carlos Sanseverino. O professor-titular de Direito Econômico e Economia Política da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) Gilberto Bercovici foi também um dos debatedores.

Direito e Fiscalização

A professora de Direito Constitucional da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Melina Fachin, disse que a Constituição construída após a ditadura militar (1964-1985) “refundou o direito” no país e o centralizou no ser humano. Mas ela avaliou que, quase 30 anos depois da Constituinte, “é preciso dar sentido a esse sentimento” do projeto de democracia social. Ela considerou haver “protagonismo excessivo e indevido do Poder Judiciário” no atual momento da vida nacional, mas que essa “postura ativa” é importante para garantir direitos mínimos. “É uma atuação que não vilipendia, mas apenas confirma o sentido do nosso texto constitucional”, afirmou.

Já o professor de Direito Constitucional da PUC-SP, Marcelo Figueiredo, criticou o Ministério Público por supostamente ultrapassar o papel de fiscalização para assumir o administrador substituto do Executivo. “Se não respeitarmos as faixas exclusivas essenciais dos poderes, nós estaremos desvirtuando a separação de poderes”, afirmou.

Figueiredo recomendou ao Judiciário se inspirar nos Estados Unidos, onde ele disse haver mais equilíbrio. “A gente vê (no Brasil), no dia a dia, o promotor de cidade querer definir tudo. O nome da rua, o sentido de direção, o que o prefeito faz ou deixa de fazer. Há uma exacerbação daquilo que se pretende ser uma fiscalização”, criticou.

Parcerias Público-Privado

O advogado Luciano Ferraz, diretor jurídico da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), apresentou um panorama das parcerias público-privadas (PPP), defendidas por ele como portadoras de um “grande princípio que é a universalização” de serviços públicos. Segundo Ferraz, os países em desenvolvimento assistiram a uma queda no volume de investimentos privado em concessões públicas no ano de 2016, mas, no caso brasileiro, há tendência de aumento nas concessões e atração de aportes. 

Ele alertou, porém, sobre a necessidade do controle na fiscalização das parcerias público-privadas para evitar aumento no déficit fiscal. “As PPP’s não podem servir como um substitutivo apenas da incapacidade de financiamento do Poder Público, porque ela traz um potencial de ampliação do endividamento público”, alertou.

Cerca de 30% do total de contratos de PPP apresentam gargalos, como descumprimento de pagamento pelo Poder Público ou dificuldades de execução das metas estabelecidas. O dado foi apresentado pelo advogado José Virgílio Lopes Enei. “O cenário não apresenta só dados positivos. Apresenta, também, problemas relevantes”, alertou.

Na contramão da defesa da concessão de áreas públicas à exploração privada, Gilberto Bercovici defendeu o controle estatal do petróleo no Brasil sob comando da Petrobras.

O professor da USP ressaltou que 90% das reservas globais de petróleo estão sob o comando de empresas públicas. “O papel do Estado é central para a política energética em geral, em especial no petróleo”, disse.

Ele criticou a aprovação da Lei 13.010/2015, aprovada pelo Congresso revogando a obrigatoriedade da participação da Petrobras na exploração do petróleo da camada pré-sal. Segundo ele, a aprovação se deu sob a “justificativa de uma atual conjuntura desfavorável às finanças da Petrobras”. Considerou a lei sancionada pelo Senado como garantir as reservas petrolíferas a oligopólios internacionais. “O resultado da Lei 13.365 é a perda do controle nacional do petróleo”, afirmou. “Isso não passa de um disfarce para tentar ocultar a entrega do pré-sal a petroleiras internacionais”, considerou.

O diretor da Comissão de Infraestrutura da OAB-SP e vice-presidente da Comissão de Infraestrutura do Conselho Federal, Carlos Sanseverino, criticou o baixo investimento do país no setor. “Nos últimos 20 anos, o Brasil não investiu mais de 2% [ao ano] do PIB em infraestrutura. É um investimento raquítico”, disse. Uma das razões para o baixo nível de aporte, de acordo com Sanseverino, é a demora média de 7 anos do Judiciário para solucionar disputas. Segundo ele, reflete a “cultura de litigação” ensinada nos cursos de direito. “Vemos o colega de sala como oponente”, afirmou, ressaltando que a mediação deveria ser mais acionada para resolução de controvérsias.

Painel 32 – Conferência debate a necessidade de aperfeiçoar legislação no direito empresarial

São Paulo - A necessidade de aperfeiçoamento da legislação deu o tom dos debates no Painel 32, sobre Direito Empresarial, na XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, na manhã desta quarta-feira (29). O encontro foi presidido por Marcelo Mota Gurgel do Amaral, acompanhado pelo relator André Francelino e pela secretária Marilena Freitas Silvestre. 

O conceito de segurança jurídica no Direito Comercial foi apresentado pelo advogado Fábio Ulhoa Coelho, professor titular da PUC São Paulo. Segundo ele, trata-se de um conceito bastante amplo, que extrapola o Direito e alcança a psicologia e a sociologia, entre outras áreas.  No caso específico do Direito Comercial e Empresarial, a segurança é dada pela previsibilidade das decisões judiciais.  “Evidente que não é possível prever 100%, mas é possível antever”, completou. Esse aspecto é fundamental também para que o empresário não onere o consumidor com uma sobretaxa gerada pela insegurança.

O tema também foi destacado por Márcio Calil, presidente da Comissão de Direito Bancário da OAB São Paulo.  Ele destacou decisões do Superior Tribunal de Justiça que tiveram grande impacto para os bancos e para os consumidores. Mencionou em especial aquela que estabeleceu, em 2008, que não era abusiva a cobrança de juros acima de 12% ao ano, como estabelecia a Constituição de 1988. Outra medida destacada por Calil e que trouxe segurança jurídica ao setor foi tomada em 2014 e que autorizou a busca e apreensão de bens comprados com crédito bancário e não pagos integralmente.

O advogado Marcos Andrey de Sousa mostrou preocupação com o projeto do governo federal de alterar a Lei 11.101/2005, que hoje regula os processos de falência e de recuperação judicial. Ele afirmou que várias sugestões feitas para aprimorar a atual legislação não foram acolhidas pelo Ministério da Fazenda. “Temos hoje um processo burocrático, totalmente administrado pelo Judiciário, sem prazos e com difícil recuperação do empresário envolvido. O instituto da falência é como se fosse uma sentença de morte para o empresário”, declarou. Ele defendeu a criação, no âmbito do Judiciário, de varas especializadas para cuidarem dos processos de falência e recuperação judicial, de modo a conferir maior agilidade e especialização ao tratamento dos casos.

Vinícius José Marques Gontijo, conselheiro federal da OAB, tratou dos efeitos da falência sobre o crédito tributário e trabalhista. Ele mostrou as dificuldades para o advogado e para as empresas diante de divergências na interpretação da legislação existente, e disse que a questão tributária é “extremamente mal resolvida”. Citou como exemplos a polêmica envolvendo a cobrança de multas tributárias.  Enquanto a Lei de Falência não autoriza a cobrança da falida, o Código Tributário Nacional, em seu artigo 187, prevê a cobrança. “Como sempre, a Fazenda não solta o osso”, brincou. 

A incompatibilidade entre leis que tratam do mesmo tema também foi registrada na palestra que tratou do Crédito Bancário na Recuperação Judicial de Empresas. O advogado Gustavo Ramiro Costa Neto, conselheiro federal da OAB e presidente da Comissão Especial de Análise do Novo Código Comercial do Conselho Federal da OAB, defendeu que são incompatíveis dois artigos da Lei 11.101/2005: o art. 47 e o art. 49. Enquanto o primeiro trata da recuperação da empresa – e é o mais importante, na avaliação de Costa Neto, pois a lei deve incentivar essa recuperação –, o segundo trata de créditos não sujeitos à recuperação judicial, como os créditos bancários, dificultando a retomada das atividades da empresa em dificuldade.

Por fim, Marcelo  Von Adamek, presidente da Associação dos Advogados de São Paulo (AASP), ao tratar da Penhora de Quotas ou Ações de Sociedade no Código de Processo Civil de 2015, fez uma análise de cada um dos artigos que tratam do assunto, especialmente o Artigo 861, e apontou as interpretações existentes. 

Painel 31 – Conferência debate importância de igualdade e ações afirmativas

São Paulo - A igualdade e as ações afirmativas foram os temas discutidos no Painel 31 da XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, realizado na manhã desta quarta-feira, (29), em São Paulo. O painel foi presidido por Rodolpho Cesar Maia de Morais, acompanhado pelo relator Bernardino Dias de Souza Cruz Neto e pela secretária Reti Jane Popelier, e contou com a presença de diversos especialistas no assunto.

O debate contou com a presença do presidente do Conselho Federal da OAB, Claudio Lamachia, que aproveitou a ocasião para firmar uma parceria com a Universidade Zumbi dos Palmares e assinar uma carta na qual a OAB se compromete a promover o acesso de advogadas e advogados negros aos escritórios de advocacia. “Nós, advogados, somos agentes de transformação social, temos um compromisso com a sociedade brasileira”, disse ele. “É uma alegria muito grande, nessa Conferência, estarmos assinando essa carta. Vamos buscar que todas as Seccionais firmem o mesmo acordo”. A conselheira federal Adriana Coutinho, presidente da Comissão Nacional de Promoção da Igualdade, acompanhou a assinatura.

As atividades do painel começaram com uma palestra sobre liberdade religiosa, proferida pela presidente da Comissão de Direito e Liberdade Religiosa da OAB-SP, Damaris Moura Kuo, que ressaltou a importância do evento em um contexto onde ocorrem várias violações do direito de crença. “Eu considero histórica essa manhã para a liberdade religiosa porque, pela primeira vez na história, esse tema é debatido em uma Conferência Nacional da Advocacia, principalmente pelos vários casos de intolerância religiosa que enfrentamos”, saudou.

Kuo citou que, nos últimos anos, houve um aumento de mais de 60% de casos de intolerância religiosa no Brasil, sendo que um terço dos episódios envolve religiões de matriz africana. “Os casos são subnotificados e não refletem toda a realidade. Veja, uma pedrada em uma criança, em 2015 (se referindo à agressão a uma menina de 11, membro de uma família candomblecista do Rio de Janeiro), atingiu toda a sociedade brasileira. Trouxe um grande debate, porém, ainda hoje, temos muitas casas depredadas, alunos reprovados, trabalhadores demitidos, vidas ceifadas e violentadas pela intolerância religiosa”, lamentou.

“A intolerância religiosa não é algo novo no Brasil”, analisou a palestrante. “Porém, foi somente com um decreto, promovido por Rui Barbosa – e que marcou o Brasil – que separou-se Estado e Igreja, permitindo liberdade de culto e proibindo a catequese nas escolas. Instaurou-se, portanto, o laicismo no Brasil”, completou. Segundo Kuo, a OAB tem realizado diversas ações para garantir a liberdade religiosa. 

“Há 11 anos, a OAB-SP, sensível ao tema, criou a primeira Comissão de Liberdade Religiosa e avançou com altivez no tema, oferecendo aos cidadãos brasileiros seu trabalho, sem arroubos acadêmicos, mas com a intencionalidade de conhecer os problemas, investigar e propor soluções, o que atraiu pessoas do mundo inteiro”. Após a palestra, foi proposto que a OAB apoie a recém-criada Frente Parlamentar que apregoa a liberdade religiosa, emprestando seus 11 anos de atividades para somar esforços contra a intolerância, além de promover debates sobre ensino religiosa e liberdade religiosa no trabalho.

Na palestra “Cotas, Reparação da Escravidão e o Papel da Advocacia”, Humberto Adami, presidente da Comissão Nacional da Verdade da Escravidão Negra no Brasil, lembrou da instalação das pioneiras políticas de cotas no Brasil, na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) e na Universidade do Estado da Bahia (Uneb). 

“Passamos 15 anos julgando as cotas inconstitucionais e, depois de um tempo, a OAB deliberou a favor das cotas. Isso foi muito importante, não só para o julgamento, mas, também, porque havia um receio de que o Conselho Federal se posicionasse contra as medidas de reparação, o que, felizmente, não ocorreu. O Estado brasileiro segue cometendo crime de racismo e o papel da advocacia é estar presente nessa demanda”, alertou. Segundo o palestrante, durante muito tempo discutiu-se a inconstitucionalidade, porém foi aceita a constitucionalidade das cotas e, portanto, juristas não podem colocar-se contra essa política, devido ao efeito vinculante da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). .

“É importante, também, lembrar que, nesses últimos tempos, discutiu-se a conta das políticas de reparação, já que política de cotas é algo pequeno quando comparado ao holocausto de 400 anos vivido pela população negra”, destacou Adami. “Além disso, o Estado nunca se desculpou. Por isso, propomos a criação da Comissão da Verdade da Escravidão, já que a história da população afro-brasileira tem sido afastada do Brasil”, explicou.

Após a palestra, Adami propôs – e foi aprovado – que as faculdades de Direito e o Exame da Ordem incluam aulas de história e cultura africana e indígena nos currículos e provas, respectivamente e, também, que o Conselho Federal da entidade, junto com as Seccionais, instaurem cotas para negros, pardos e indígenas na composição das diretorias.

Carlos Moura, presidente da Comissão Brasileira de Justiça e Paz, palestrou sobre igualdade racial, apontando caminhos para incorporar à sociedade os indivíduos que estão fora do processo de desenvolvimento do país em função do racismo. “É preciso encontrar mecanismos para que toda a sociedade possa trabalhar junto para superar a desigualdade. Precisamos aceitar o diferente, o outro como ser humano, na perspectiva de reconhecer os valores intrínsecos de cada pessoa. Afinal, há sempre uma complacência: ‘É isso mesmo’, ‘Deixemos como está’, ‘Podemos criar problemas e dificuldades’.”, argumentou.

Segundo Moura, a advocacia tem papel fundamental nessa luta. “Nós, como seres humanos e operadores do Direito, devemos agir. O único modo de corrigir desigualdades é colocar o peso da lei em um mercado desequilibrado. Falta a percepção de que não se pode não falar em Constituição Federal sem falar, acima de tudo, em igualdade”, ponderou. Após a palestra, foi proposta e aprovada que a OAB faça uma campanha junto com as secretarias municipais de educação para promover a formação de professores que lecionem aulas de História e Cultura Africana e Indígena.

Justiça indígena

Continuando as atividades, Márcio Rosa da Silva, promotor de Justiça, abordou os diálogos com sistemas de Justiça indígenas. “Moro em um estado [Roraima] em que 41% do território é composto por terras demarcadas e 10% da população se declara indígena. No território nacional, temos 13,8% do território nacional composto por terras indígenas, o que torna esse assunto bastante relevante.”

Para o palestrante, a Legislação Brasileira garante a coexistência da Justiça do Estado brasileiro e das nações indígenas. “Se queremos uma Justiça mais democrática e efetiva, o sistema jurídico dos povos indígenas tem que ser reconhecido. Há uma celeuma, mas a Constituição já admite isso, ao reconhecer a organização social das comunidades indígenas. Ou seja, também aceita sua Justiça. Devemos avançar para a coexistência dos sistemas de Justiça. Os povos indígenas têm o direito à autodeterminação e um princípio que devemos defender e respeitar é seu sistema de resolver conflitos”, lembrou. Após a palestra, foi proposta e aprovada que a OAB proponha uma atualização da Legislação Brasileira que reflita a Declaração da Organização das Nações Unidas (ONU) para os Direitos dos Povos Indígenas. 

Na palestra “Proteção dos Conhecimentos Tradicionais e do Patrimônio Genético em Terras Indígenas”, o advogado Edson de Oliveira, destacou que 70% dos medicamentos produzidos no mundo têm origem em conhecimentos tradicionais. “Em produtos desenvolvidos pela indústria farmacêutica com base em ‘pesquisa e erro’, demora-se 12 anos para o medicamento chegar às prateleiras. Quando se utiliza os conhecimentos tradicionais, esse tempo é de somente seis anos”, comparou. 

A última palestra, “Imigração e Refugiados”, foi proferida pelo presidente da Confederação Israelita do Brasil, Fernando Lottenberg, que lembrou a necessidade de encarar o processo migratório como algo intrínseco da humanidade. “Um exemplo disso é a Europa que, hoje, enfrenta uma grande crise com as milhares de pessoas que chegam às suas portas. Porém, em muitas outras ocasiões, os imigrantes era o próprio povo europeu”, relembrou. 

Lottenberg também comentou os benefícios da nova Lei de Migração, que abandona a visão de que o imigrante é uma ameaça à segurança nacional, tratando-o, agora, sob a ótica dos Direitos Humanos. “É resultado de mais de 30 anos de estudos e projetos e estabelece direitos e deveres dos imigrantes, bem como políticas públicas, em substituição ao Estatuto do Estrangeiro, que criminalizava o imigrante e negava direitos, como trabalho, participar de sindicatos etc. 

Já essa nova lei, aprovada em um momento de aumento da xenofobia diante de imigrantes e refugiados, traz, entre as inovações, a igualdade de oportunidades entre brasileiros e imigrantes e os vistos humanitários que podem ser concedidas em situações de risco ou vulnerabilidade.

Painel 30 – A importância da liberdade de expressão e de imprensa em debate na Conferência

São Paulo - O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto, o presidente da Comissão Especial para a Liberdade de Imprensa da OAB-SP, Walter Vieira Ceneviva, a advogada Tais Gasparian, o advogado Miguel Angelo Cançado e o conselheiro federal da OAB Adrualdo Lima Catão foram os debatedores do Painel 30 da XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, “Liberdade de Expressão e Liberdade de Imprensa”, realizado nesta quarta-feira (29), em São Paulo.

O presidente do Painel 30 foi Paulo de Souza Coutinho Filho, tendo como relator Sérgio Eduardo da Costa Freire e como relator, Lucivaldo da Silva Costa.

O debate teve como objetivo ponderar sobre os desafios interpostos ao pleno gozo da liberdade de expressão em todas as modalidades, especificamente no que diz respeito à função de catalisadora pública de ideias por meio da comunicação de massa. Os conferencistas analisaram ainda os diversos mecanismos constitucionais relacionados ao assunto e as implicações deles e chegaram a uma conclusão consensual: qualquer modalidade de censura ou restrição à liberdade de expressão coloca em risco todas as manifestações desse direito fundamental.

“Sigo sempre a Constituição de 1988, que é copiosamente principiológica. E ela faz um entrelace de princípios e regras para imprimir a si mesma ganhos de funcionalidade sistemática, holística. Por isso, é muito difícil um tema central da vida que não encontre na Constituição de 1988 pelo menos o início de uma formulação normativa”, iniciou Ayres Britto. 

“Pensamento, informação, expressão artística ou científica e comunicação são valores da liberdade de expressão que compõem o próprio indivíduo humano. São os direitos mais importantes do indivíduo após o direito à vida, verdadeiros bens de identidade individual e coletiva. A forma coletiva da expressão é a imprensa, e a Constituição diz que é ‘plena’ a liberdade de imprensa. O pleno é uno, o monolítico é aquilo que não tem brechas nem frinchas --ou seja, sem espaço nenhum para qualquer forma de censura”, afirmou.

Ayres Britto afirmou ainda que há leis e regulamentos para punir para quem abusar da liberdade de expressão, mecanismos que existem em defesa dos mesmos “bens de personalidade” que justificam o direito de manifestar-se livremente, mas que não justificam nenhuma forma de censura prévia. 

"Há um primeiro bloco de bens de personalidade que inclui intimidade, vida, honra e imagem. E há um segundo bloco, da manifestação do pensamento e a expressão, latu sensu. As disposições da Constituição indicam que ela 'escolheu' por esse segundo como prioritário. Se a pessoa abusar desse direito, responderá por isso. Mas não há espaço para censura prévia", explicou. “A liberdade de expressão é a maior expressão da liberdade e tem uma relação de retroalimentação com a própria democracia”, concluiu.

Liberdade de imprensa

Complementarmente, Ceneviva expôs alguns dos principais mecanismos relativos à liberdade de imprensa na Constituição: os artigos 170, 220, 221, 222 e 223 lidam com livre concorrência, a proibição de monopólios e oligopólios no setor da Comunicação e as regras gerais para concessão de rádio e TV. A legislação em torno do tema é farta, mas desatualizada: as novas ferramentas de comunicação digital, por exemplo, não estão contempladas pela lei, situação grave em um país que detém o sexto maior mercado de mídia do planeta. 

“Neste instante, em que participamos desta Conferência, certamente há mais telefones móveis do que pessoas aqui, porque as pessoas às vezes têm dois, três aparelhos. Isso não existia em 1988, não poderia ter sido previsto pelos constituintes. Outra mudança importante aconteceu: naquela época, o negócio da mídia era exclusivamente a verdade. Hoje, em que gera-se valor por meio de algoritmos, em que o mero clique gera nanocentavos para o dono da página sendo acessada, existe o ‘business’ da mentira digital. Lidar com essa nova modalidade de comunicação em massa é um desafio para todos nós”, ponderou.

A existência de agentes que fazem das mentiras em massa um plano de negócios, porém, ainda não é suficiente para justificar qualquer restrição à liberdade de expressão. Para Adrualdo de Lima Catão, nem mesmo os discursos de ódio justificam que se relativize o direito da livre manifestação. “É importante destacar que a defesa do direito do outro de expor as idéias não significa que concordemos com essas idéias. Precisamos nutrir esse valor porque a liberdade de expressão não admite brechas de nenhuma natureza, sob risco de que o direito como um todo seja perdido”, ponderou.

“Acredito que o recado mais importante diante de todas as situações é que devemos parar de enfatizar as exceções no que diz respeito ao pleno direito à liberdade e enfatizar esse direito em si. Não podemos e não devemos relativizar os direitos e, em especial, esse direito, como infelizmente ainda acontece com frequência nas salas de aula, nos fóruns e em outros espaços de debate”, complementou.

Miguel Angelo Cançado expôs ainda outra ameaça à liberdade de expressão: o debate sobre o direito ao esquecimento frequentemente se choca contra princípios da liberdade de expressão. “Do que se trata o direito ao esquecimento? É a reivindicação de indivíduos que querem impedir a publicização ininterrupta de fatos reais que os envolvam. É o direito de ser deixado quieto. É diferente do caso onde há uma notícia falsa ou incompleta. Para isso, há outros mecanismos”, explicou. “O problema é que é impossível e agride a liberdade de expressão como princípio constitucional. No fim das contas, o direito ao esquecimento só é relevante quando a própria notícia é relevante para a sociedade”, ponderou.

Jornalistas e políticos

Falando a partir do ponto de vista dos produtores de informação, a advogada Taís Gasparian expôs as reflexões sobre os mecanismos legais que garantem o sigilo de fonte e a importância desse conceito para a realização da liberdade de imprensa. “A defesa do sigilo da fonte é a defesa do próprio direito ao acesso da informação pela população. Infelizmente, no Brasil, há pouca compreensão sobre isso. As violações a esse princípio que acontecem no Brasil, aliás, são muitas vezes por ordem judicial, o que é grave e, por isso, é tão importante trazer para cá esse debate”, afirmou.

Taís explicou que a preservação de arquivos, notas ou registros telefônicos, não apenas a identidade de informantes, também está incluída nesse direito. “Da mesma forma, se o jornalista rompe o acordo ético que fez com seu informante e o revela contra sua vontade, ele também pode ser responsabilizado penalmente por isso”, disse. “Ou seja, não é coincidência que o direito de acesso à informação e a obrigação de resguardo da fonte estejam no mesmo artigo da Constituição. São direitos intrinsecamente conectados e que valem em muitos sentidos, não só para proteger jornalistas. Trata-se da concretização do direito constitucional de informar e ser informado”, concluiu.

Já Carlos da Costa Pinto Neves debateu como a Justiça Eleitoral, por meio de restrições às campanhas políticas, agride direitos também dos cidadãos. “O Estado deve sempre abster-se de interferir no exercício dos direitos e liberdades. Pelo contrário, deve ter uma ação positiva nesse sentido, protegendo e incentivando, praticando a prestação positiva. Exemplo de prestação positiva é a propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV: é uma medida para incentivar o debate. Devemos, aliás, nos perguntar: a quem interessa a demonização da propaganda eleitoral? Que é uma coisa feia e suja, que não deve estar nas ruas? A quem interessa demonizar a política?”, questionou.

“Claro que pode haver situações em que propagandas específicas têm de ser restringidas, mas nunca no sentido de emular igualdade plena na disputa eleitoral, porque não existe equidade plena. Se assim fosse, o Congresso seria apenas uma divisão equânime entre os partidos. Dá-se à propaganda ares de concessão estatal, de autorização do governo, enquanto trata-se do direito da expressão política do cidadão. Por que o cidadão não pode pintar o próprio muro? Por que o cidadão não pode pendurar publicidade maior que meio metro quadrado em sua casa? Não existe sistema político mudo”, defendeu.

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Painel 29 – Com auditório lotado, especialistas defendem valorização de honorários

São Paulo - Na manhã desta quarta-feira (29), terceiro dia da XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, o painel sobre Honorários Advocatícios lotou o auditório. Mais de mil congressistas acompanharam os debates, realizados por especialistas no assunto. O presidente da mesa foi Alexandre Cesar Dantas Socorro, que apresentou todos os temas e palestrantes. Valentina Jungmann Cintra foi a relatora. 

Para explicar sobre a natureza extraconcursal dos honorários contratuais, o desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região Kassio Nunes Marques apresentou um leading case. Ele iniciou expondo duas controvérsias e propondo diversas reflexões sobre o tema. “Sobre a prioridade no pagamento de honorários advocatícios, peritos, contadores e administrares de massa falida, a justificativa é a essencialidade para a constituição, preservação e regularidade da massa, e não integra o fundo de propriedade do falido”, afirmou Marques. 

O presidente da OAB do Distrito Federal falou na sequência sobre como estimar e valorizar os honorários. Juliano Costa Couto abriu a palestra dizendo que, muitas vezes, o jovem advogado não consegue perpetuar-se na profissão porque a faculdade não ensina sobre honorários. Compartilhou, também, que, antes, o advogado era um amigo da família, bastava ganhar a causa para que o cliente ficasse satisfeito. 

"Hoje, se tiver qualquer problema durante o processo, o cliente procura outro advogado. Construir uma marca é um grande desafio. Mantê-la é um desafio ainda maior. O mais difícil não é chegar ao preço ideal de honorários, mas ouvir o sim do cliente. Ganhe confiança, mostre expertise e, só depois, passe o preço. O preço mínimo é mais importante que o preço máximo. Evite prejuízos”, instruiu Couto.

Na sequência, foi a vez do presidente da OAB de Goiás, Lúcio Flavio Siqueira de Paiva, falar  sobre julgamento parcial do mérito e honorários advocatícios. Ele explicou o tema, que permite que o juiz "fatie" o processo, julgando o mérito de forma parcial. “A decisão que julga parcial e antecipadamente tem um invólucro de decisão interlocutória, mas um conteúdo típico de sentença, o que questiona a natureza jurídica”, enfatizou Paiva, que apresentou, ainda, pontos sobre recursos cabíveis, honorários sucumbenciais, além de apresentar casos atuais julgados favoráveis e contrários.

O tema seguinte foi honorários na advocacia pública, abordado por Darlan Barroso, diretor pedagógico do Damásio Educacional. O painelista abriu a fala afirmando que o honorário é o que traz dignidade e independência ao profissional. “O advogado público tem direito aos honorários advocatícios de acordo com a lei. Surgiram legislações locais e a Legislação Federal veio em conformidade com o que Código de Processo Civil limitou”, garantiu Barroso, que apresentou a questão dos defensores públicos, sobre quando o pagante é a própria Fazenda. 

Ao final da palestra, ofereceu duas proposições. Foram elas: atuação do Conselho Federal de apoio ao reconhecimento da constitucionalidade do §19, do artigo 85, do Código de Processo Civil e atuação do Conselho Federal para a revisão/cancelamento da Súmula 431 do Supremo Tribunal de Justiça (STJ). Ambas foram aprovadas, a primeira, por ampla maioria, e a segunda, por unanimidade.

Eduardo Talamini, professor da Universidade Federal do Paraná, iniciou a explanação com os fundamentos dos honorários de sucumbência em geral para, em seguida, abordar o caráter inovador da regra de honorários recursais. Abordou ainda o não cabimento em processos que excluem honorários, recursos contra decisões interlocutórias que também não os contemplam, no caso de provimento de recurso, embargos de declaração e agravo interno. Concluiu refletindo quanto à necessidade de redimensionamento de limites. 

A diferença entre Justiça gratuita e acesso à Justiça foi a forma que o advogado Roberto Rosas escolheu para iniciar a palestra. Ele comentou a respeito da Defensoria Pública no Estado de São Paulo e sobre a remuneração do defensor dativo. “A conclusão é fácil, porém há resistência no pagamento dos honorários ao advogado dativo”, concluiu Rosas. 

O advogado e membro nato da OAB de Minas Gerais Raimundo Cândido Junior, citado com muita admiração por todos os demais membros da mesa, finalizou as palestras do painel, discursando sobre sucumbência parcial e honorários. Afirmou existir um problema entre os artigos do CPC de 1973 e o Estatuto da Advocacia, tendo sido o último "sepultado pelo Código de Processo Civil". “Uma lei que é posterior no tempo deveria prevalecer e não a lei anterior”, afirmou, ao citar a má-interpretação do STJ sobre o assunto.  

Antes do encerramento, foi realizada a votação de nova proposição, de autoria de Juliano Costa Couto. Ele pede que a OAB, por meio dos órgãos competentes, busque a presença de matérias afetas à gestão de escritórios na grade curricular dos cursos de Direito, que foi aprovada pela maioria. Ao concluir os trabalhos, o presidente da mesa fez um apelo aos advogados presentes: “Temos que evitar o leilão do nosso serviço ou será desconsiderado o que realmente valoriza o trabalho”, clamou. 

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Painel 28 – Especialistas debatem como tornar o Poder Judiciário mais eficiente

São Paulo - O Painel 28 da XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, realizado na manhã desta quarta-feira (29), em São Paulo, reuniu importantes juristas para debater o desafio da eficiência do Poder Judiciário. O encontro foi aberto pelo presidente do painel, Mário Sérgio Duarte Garcia, membro honorário vitalício da OAB, que destacou a atualidade do tema e a oportunidade de reunir importantes representantes do mundo jurídico para debater essas questões. 

“O desafio da eficiência do Poder Judiciário” teve como relatora Veralice Gonçalves de Souza Veris e por secretário Paulo Eduardo Pinheiro Teixeira. O painel ainda contou com a participação extraordinária do presidente da OAB/SP, Marcos Costa.

Humberto Martins, ministro do Superior Tribunal de Justiça, salientou não haver uma hierarquia entre advogado, juiz ou membros do Ministério Público. “Sem advogado não existe Poder Judiciário. O veículo da comunicação da parte é o advogado. Por isso o Poder Judiciário, antes de tudo, precisa da ação primeira do advogado”, afirmou.

Ainda destacou a importância do agir com ética na aplicação do Direito: “O advogado tem responsabilidade na luta pela dignidade da pessoa humana, e o juiz é a confiança entre as partes. A sociedade só acredita em um juiz coerente, com ética, em um juiz sem partido. Esse é o juiz que queremos, que desejamos, que aspiramos”, sublinhou.

Para José Rogério Cruz e Tucci, diretor da Faculdade de Direito da USP, o tempo da Justiça “não pode suplantar a angústia das partes”. Quando esse tempo “extrapola o razoável, passa a ser um tempo patológico”, afirmou. Também enfatizou que o problema da morosidade da Justiça não é exclusivo do Brasil e que “desde o Direito Romano, a história do processo é uma luta contra o tempo. Por isso há uma necessidade de combater, pelas vias adequadas, a morosidade do processo”.  

Poder Judiciário e os desafios da advocacia

O presidente da OAB-RJ, Felipe Santa Cruz, falou da necessidade de se fazer uma repactuação sobre o que se espera da profissão, reafirmando a importância da ética e dizendo que a Ordem tem sido rigorosa com desvios éticos de advogados. Também fez críticas à formação dos novos advogados. “Nós temos que ter uma advocacia qualificada, que evite os conflitos, que solucione os litígios --90% dos casos poderiam se resolver nos nossos escritórios de advocacia, sem precisar ir para o juiz”, afirmou. 

Também criticou a falta de juízes em muitos Estados brasileiros, que não atingem a proporção mínima de juiz por habitante recomendada pela ONU: “É um paradoxo fechar comarcas, como se o Judiciário tivesse que dar lucro”, asseverou.

O ex-ministro do STJ Sidnei Beneti começou sua palestra dizendo ser preciso rever a ideia de que o juiz é um profissional generalista. “Além de ser um especialista da arte de julgar, hoje em dia é necessário ser um especialista daquilo que vai julgar”, comparou. Ele afirmou que a especialização é fundamental para a celeridade dos processos. Ainda destacou que a especialização é essencial em tribunais grandes, e não apenas no primeiro grau: “Se fosse aplicada a especialização nos tribunais intermediários, inclusive dentro das turmas do STJ, muita coisa estaria resolvida com mais facilidade”, disse.

A razoável duração do processo

A gestão de cada unidade jurisdicional é um dos aspectos mais relevantes para colaborar com a eficiência e a celeridade dos processos, defendeu o desembargador Carlos Eduardo Pugliesi, do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região. “O Judiciário é eficiente em muitos casos e pode ser eficiente de forma integral. A efetividade passa pela ação de todos os envolvidos, mas sem dúvida pela ação do magistrado”, afirmou. “Eu trabalho com a perspectiva de que a eficiência do Judiciário passa pela gestão. E juiz tem que ser integralmente juiz, não existe gestão eficiente sem juiz presente”, frisou o desembargador.

O diretor do curso de Direito da Universidade Nove de Julho (Uninove), Sergio Pereira Braga, destacou o papel da educação desde o ensino básico para poder formar cidadãos e até futuros advogados mais conscientes de seu papel. “Como formadores dos futuros profissionais do Direito devemos pensar, antes da formação jurídica, na formação cidadã. A qualidade do ensino não pode ser apenas técnica, mas também humana”, explicou. Para ele, uma melhor formação também irá influenciar em questões relacionadas à morosidade. 

O advogado e diretor-executivo do Instituo Pro Bono, Marcos Fuchs, afirmou que em 72% das localidades que possuem juízes no Brasil há graves problemas de acesso à Justiça por parte dos mais pobres. Isso se deve à falta de defensores públicos. Lembrando de figuras históricas como Rui Barbosa e Luiz Gama, precursores da advocacia pro bono, Fuchs defendeu que estudantes de Direito deveriam fazer estágio nessa modalidade. “Necessitamos de mais advogados que ajudem a população. Buscamos acesso a uma Justiça mais digna para todos os brasileiros que necessitam”, declarou.

Painel 27 – Os caminhos para uma reforma administrativa em debate na Conferência

São Paulo - A Reforma Administrativa foi o tema do Painel 27 da XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, na manhã desta quarta-feira (29), em São Paulo. O painel teve como presidente Andrey Cavalcante de Carvalho, como relator Helder José Freitas de Lima Ferreira e como secretário Luiz Bruno Veloso Lucena.

O advogado Clovis Beznos apresentou o tema “Intervenção do Estado no Domínio Econômico: Desafios”. Durante a exposição, entre outros, ele destacou duas grandes atividades: serviços públicos, sob domínio do Estado, e atividades econômicas, sob responsabilidade de particulares. “A livre iniciativa e a concorrência são previstas na Constituição. Nosso capitalismo é envolvido também por princípios que lhe dão conotação social que ele não deve esquecer. A Constituição, ao assegurar a propriedade, também deve assegurar a função social”, afirmou.

Já a procuradora da Fazenda Nacional Carolina Zancaner Zockun abordou os serviços públicos, o regime jurídico e a terceirização. Um dos aspectos que ela frisou relaciona-se à redução dos trabalhadores públicos, que são hoje 24% menos se comparados aos da iniciativa privada na mesma função. “Em 20 anos, os servidores da União diminuíram em mais de 75 mil pessoas. E isso tem a ver com a terceirização. Nesse período não se efetuaram concursos públicos”, afirmou.

Em seguida, o advogado Márcio Cammarosano abordou o processo de contratação pública. O advogado iniciou com um histórico a partir da reforma na administração pública do Estado, em 1995, avançou em questões sobre o controle mediante processo no que se refere a resultados – segundo ele inspirado no setor privado – e concluiu com a Constituição de 1988: “Infelizmente, o processo de contratação tem muitas distorções. Vemos ainda que há muitas ofensas à ordem jurídica, com a formação de cartéis e pagamento de propinas”, afirmou o advogado.

O advogado Marçal Justen Filho falou sobre o tema “Parcerias Público Privadas”. Ele ponderou ser possível aludir às PPP's em vários países, exceto em nações em que elas não existem, como os EUA, ou na Coreia do Norte, “onde aludir à PPP é uma tolice”.

Segundo ele, entre os problemas mais candentes no que se refere às PPP's está uma assimetria cognitiva entre a crescente especialização globalizada presente na iniciativa privada e as dificuldades encontradas nesse quesito no setor público. “Também acredito que fatores como a licitação e o regime jurídico de contratação têm que ser revistos no Brasil”, afirmou.

O advogado Rubens Naves abordou o tema Terceiro Setor. Ele abriu a intervenção falando dos direitos fundamentais das organizações da sociedade civil, bem como das suas origens, além da reforma do Estado. “O Brasil não pararia de pé sem os serviços das organizações sociais e do Terceiro Setor, que foi severamente reprimido pela ditadura, mas que resistiu e cresceu”, disse.

O tema “Reformar o Estado pela (re) interpretação do Direito Público: Projeto de Lei do Sendo 349/2015” foi o assunto escolhido por Flávio Boson Gambogi, membro da Comissão de Direito Administrativo do CFOAB. O advogado afirmou que o projeto teve como uma das motivações inserir dez artigos sobre a interpretação do Direito Público no que se refere ao tema.

Segundo ele, o projeto tem, entre as finalidades, melhorar a qualidade da atividade jurírico-decisória na gestão pública e, assim, obter a máxima efetuação dos princípios da eficiência e da segurança. “Temos grandes problemas no que diz respeito à paralisação de obras”, afirmou.

Precatórios

Na continuação do painel sobre direito administrativo, o regime de precatórios foi tratado como uma excrescência jurídica, algo que sequer deveria existir, concluíram os expositores. O presidente da Comissão Especial de Precatórios da OAB, Marco Antonio Innocenti, destacou o papel da Ordem no tema, não apenas propondo soluções, mas enfrentando os devedores nos tribunais, como na ADI 4357, em que o STF considerou inconstitucional a EC 62/2009, determinando o pagamento integral dos débitos até 2020.

“O Brasil jamais terá algum protagonismo internacional se não acabar com os precatórios, pois são uma das mais exuberantes facetas da insegurança jurídica no país, na medida em que permite que a União, Estados e municípios apliquem sucessivos calotes nas suas obrigações, inviabilizando a criação de  com uma verdadeira economia de mercado”, afirmou.

“Além disso, os precatórios são fonte de corrupção na administração  pública e uma das maiores causas da lentidão do Judiciário, na medida em que os incidentes nas execuções dos débitos judiciais produzem centenas de milhares de recursos, inviabilizando a própria atividade de prestação jurisdicional pelos tribunais”, finalizou.

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Painel 26 – ‘O Brasil não suporta mais a corrupção’, diz presidente nacional da OAB

São Paulo - O presidente do Conselho Federal Claudio Lamachia afirmou na manhã desta quarta-feira (29) que “o Brasil não suporta mais a corrupção”. Ele participou do Painel 26 da XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, cujo tema foi As Causas da Corrupção e seu Devido Combate, ao lado de nomes relevantes do meio jurídico como o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso, o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, Rodrigo Pacheco, e o advogado Antônio Cláudio Mariz de Oliveira.

Lamachia ressaltou que investigar casos de corrupção não é ser contra a política e, sim, melhorar o ambiente político do país. No entanto criticou desvios procedimentais cometidos pelo Judiciário. “A OAB é intransigente no combate à corrupção, mas temos de fazer isso dentro da lei, porque não se combate um crime cometendo outro crime”, disse.

O painel foi presidido por Bernardo Cabral, que contou com a relatora Márcia Regina Approbato Machado Melaré e o secretário João Paulo Tavares Bastos Gama. Entre os debatedores estiveram a advogada Dora Cavalcanti e Darci Norte Rebelo. O presidente da Comissão Especial de Combate à Pirataria da OAB-SP, Eduardo Ribeiro Augusto, abordou a violação ao direito autoral e propriedade intelectual.

O ministro Barroso considerou que a investigação de condutas criminosas por agentes públicos é uma “demanda da sociedade" e reflete um anseio no país por "integridade, patriotismo e honestidade”. “O Brasil já mudou, o trem já saiu da estação, nada será como antes. Já não se varre o lixo para debaixo do tapete”, afirmou.

O magistrado do STF chamou de “fotografia devastadora” a descoberta de um vasto esquema de corrupção pela Operação Lava Jato, envolvendo entes públicos e privados. Contudo classificou como bom "o filme" da história brasileira dos últimos 30 anos. “Em uma geração, nós derrotamos a ditadura, a inflação e a pobreza extrema. Nada é invencível, nada é impossível. Também a corrupção não é invencível”, disse.

Foro privilegiado

O ministro Barroso afirmou que o “foro privilegiado cria impunidade” e precisa ser extinto em todas as instâncias públicas. Ele sugeriu a criação de tribunal específico - vinculado ao STF - para julgar casos de improbidade administrativa. “O foro privilegiado é uma jabuticaba que já apodreceu no Brasil”, asseverou.

Lamachia reforçou a crítica do ministro ao foro. “Nós precisamos encontrar mecanismos para reduzir ou acabar com o foro privilegiado. O foro hoje é uma anomalia na nossa democracia. Ele fere uma prerrogativa que é a de que todos somos iguais perante a lei”, disse.

O presidente da CCJ observou que a mudança do fim do foro privilegiado está em tramitação. Ele defendeu o fim do foro em todas as instâncias. Porém defendeu mudanças na Lei de Delação Premiada e a suspensão da prisão após decisão em segunda instância. “É preciso deixar claro para a sociedade que o sujeito pode ser preso em determinados casos [após decisão em segunda instância], mas não sempre e qualquer situação”, afirmou.

Pacheco criticou supostos desvios de preceitos constitucionais com o objetivo de punir corrupção contra o erário público. “A corrupção é uma grande chaga no Brasil e precisa ser combatida com todos os mecanismos. Mas o combate a essa chaga nacional não pode fazer com que a Constituição seja corrompida”, disse o deputado.

Mariz de Oliveira concordou com o parlamentar, afirmando que o “melhor caminho para combater a corrupção é combater as causas do crime”, ressaltando que “a punição é pós-crime”. 

Nesse sentido, a advogada Dora Cavalcanti disse haver no meio advocatício “perplexidade” diante da ameaça de validação de provas ilegais, conforme previa o projeto de lei com dez medidas contra a corrupção. “Me questiono se essa flexibilização, já norteada por uma ótica de que os fins devem justificar os meios, não funciona como uma retroalimentação da corrupção no Brasil”, sugeriu.

Dora avaliou que considerar uma hipótese como essa é “entrar na lógica de combater injustiça praticando injustiça”.

Já a prática cotidiana de conviver com desvios de conduta foi abordada pelo presidente da Comissão Especial de Combate à Pirataria da OAB-SP, Eduardo Ribeiro Augusto. Segundo ele, a compra de produtos falsificados é uma das formas de corrupção. “É muito fácil criticarmos a conduta de políticos corruptos por terem cometido algum tipo de irregularidade. Por outro lado, temos produtos falsificados na nossa casa. Qual a diferença dessas condutas?”, provocou.

Defesa da advocacia

Mariz de Oliveira defendeu a advocacia, apontada por ele como uma profissão que enfrenta a maior crise vista por ele em 50 anos de profissão. “Eu diria que, nos dias de hoje, defender a advocacia é ter coragem. Está mais difícil advogar nos dias de hoje do que nos dias nebulosos da ditadura militar”, afirmou.

Ele criticou barreiras que têm impedido o acesso à íntegra de investigações contra clientes. “Hoje, a produção de prova é seletiva. Os autos estão nas gavetas. O advogado tem grande dificuldade de ter acesso às provas, grande dificuldade de dizer aos familiares porque o acusado está sendo preso”, disse.

O presidente do Painel, Bernardo Cabral, defendeu a fala de Mariz e lembrou que teve o mandato de deputado cassado pela ditadura e ficou dez anos sem permissão para advogar. Cabral lembrou que presidiu o Conselho Federal da OAB nos anos 1980 e foi relator da Constituinte. “Eu acho que o cargo que me deu mais orgulho foi o de presidente do conselho da Ordem dos Advogados do Brasil”, declarou.

O presidente da OAB, Claudio Lamachia, comemorou a aprovação para votação pela CCJ da Câmara do projeto de lei que criminaliza a violação de prerrogativas de advogados, nesta terça-feira (28). Ele rebateu críticas ao projeto feitas por entidades de classe da magistratura e do Ministério Público. “Algumas associações entendem que esse projeto é ruim para o combate à corrupção, dizendo que vai trazer muita litigiosidade. Digo que não vai”, disse.

Homenagem 

Durante o Painel, Bernardo Cabral pediu aplausos ao professor Paulo Bonavides, de 92 anos, e um dos personagens centrais para o ensino do Direito no Brasil e à história da democracia e da OAB. O pedido do painelista foi plenamente atendido pelo público que lotou o evento.   

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