Seminário na OAB debate a tributação no escopo da Constituição Federal

Brasília – A OAB Nacional sediou nesta quarta-feira (16) o seminário “30 Anos do Sistema Tributário na Constituição Federal”, evento que reuniu expoentes do direito para analisar o legado da Carta Magna e os desafios impostos a ela na questão dos tributos. O evento foi organizado pela Comissão Especial de Direito Tributário da Ordem e contou com a presença de centenas de participantes, em Brasília.

Ao abrir o seminário, o presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, saudou a presença do membro honorário vitalício Bernardo Cabral e do ex-deputado Mauro Benevides, ambos constituintes. “O sistema tributário é um tema de extrema importância, fundamental para o desenvolvimento da sociedade e essencial para as funções do Estado. No contexto dos 30 anos da Constituição Federal, temos a oportunidade de avaliar suas conquistas e seus desafios”, frisou Lamachia, atentando para a necessidade de debate de um novo pacto federativo e de uma reforma tributária.

Lamachia exaltou as virtudes do texto constitucional quanto ao sistema tributária, como a salvaguarda dos direitos do contribuinte com isonomia, legalidade, não confisco e irretroatividade, assim como a busca da justiça social. Desafios, no entanto, também se impõem, segundo o presidente da OAB. “Passados 30 anos, permanecemos muito distantes da plena efetivação dos valores que regem o ordenamento jurídico pátrio.  A esse respeito, registro, por exemplo, a aguda desigualdade social que continua a assolar o País”, exemplificou.

“Trata-se, com efeito, de problema histórico da sociedade nacional. Para superá-lo, é necessária uma reforma profunda e abrangente de toda a organização do Estado. Isso implica, inclusive, o aperfeiçoamento do sistema tributário, que não tem conseguido concretizar, satisfatoriamente, os elevados princípios que o orientam. Em verdade, esse modelo mostra-se, na prática, não apenas disfuncional, mas também injusto – pois tem agravado a concentração de renda no País”, afirmou.

“Outro desafio é concerne à repartição desproporcional dos recursos arrecadados entre os entes federados. A título de exemplo, noto que, embora os Estados e os municípios sejam os maiores provedores de serviços públicos, mais de 50% dos impostos são destinados à União”, completou, dizendo ser urgente uma ampla reforma tributária, assim como um vigoroso combate à corrupção e à sonegação fiscal.

O presidente da Comissão Especial de Direito Tributário, Breno Dias de Paula, proferiu palestra sobre a atuação do Conselho Federal da OAB no tema, destacando a ação “ativa e intensa” em todos os debates envolvendo a defesa do sistema tributário nos últimos 30 anos. 

“O constituinte federal de 1988 acertou em criar um sistema tributário no bojo da Constituição, criando um ‘arsenal’ de defesa dos direitos dos contribuintes, delimitando princípios jurídicos da tributação”, afirmou o conselheiro federal. “Este seminário é oportunidade ímpar para refletir sobre os últimos 30 anos e os próximos 30. O que o sistema nos proporcionará nas novas atividades econômicas, por exemplo, e os novos desafios, buscando tributação mais justa, solidária, progressiva e redistributiva. ”

A mesa de honra de abertura do seminário “30 Anos do Sistema Tributário na Constituição Federal” contou ainda com as presenças de: Cléa Carpi da Rocha, conselheira federal e detentora da Medalha Rui Barbosa; Luiz Gustavo Bichara, procurador tributário do CFOAB; Felipe Santa Cruz, presidente da OAB-RJ; e Elton Assis, ouvidor-adjunto da OAB.

Gênese do sistema

No primeiro painel da manhã, o ex-presidente da OAB e deputado constituinte Bernardo Cabral apresentou a gênese do sistema tributário na Constituição de 1988. Na trajetória, explicou, foram criadas diversas comissões temáticas entre os parlamentares, divididas entre os assuntos. Na tributária, revelou, dois anteprojetos foram os principais fios condutores, mas o texto final acabou deturpando algumas ideias e conceitos. O painel teve a presidência de Felipe Santa Cruz e Luiz Gustavo Bichara como debatedor.

“Quem ler o texto da Constituição sem paixões poderá, descontados os problemas de qualquer obra humana, atestar que se trata de um diploma exemplar e renovador, que ajudou a consolidar a democracia.  Cumpre extrair dela suas virtudes, em vez de modificar o texto principal. Como disse Ulysses Guimarães: ‘Essa Constituição terá cheiro de amanhã e não de mofo’. Tanto isso é verdade que ela completa 30 anos”, disse. O vice-presidente da Constituinte, Mauro Benevides, elogiou a atuação de Bernardo Cabral como relator do projeto, “figura preeminente de nossa Assembleia”.

O papel do STF

O segundo painel do seminário debateu a evolução da jurisprudência das Cortes Superiores, notadamente o STF, na seara tributária. O advogado, professor e autor de obras Roque Carrazza explicou que a Constituição de 88 foi extremamente minuciosa ao garantir direitos fundamentais do contribuinte e que, assim, o Poder Judiciário tem assumido protagonismo em relação aos demais. 

Segundo Carrazza, a Constituição delimita em quatro áreas a matéria tributária: discrimina competências tributárias; classifica tributos em espécies e subespécies; cria regra-matriz de incidência de tributos; e limita exercício de competências tributárias por princípios como legalidade e razoabilidade. Ao dizer que é necessário observar o garantismo jurídico, Carrazza também enalteceu o papel do STF.

“Quero, por fim, enaltecer o STF por haver procurado concretizar cada vez mais os direitos fundamentais dos contribuintes, sempre se atualizando e não se repetindo. Científico, mas humanos e idealista, imita o poeta que luta por um Brasil melhor. Respeita o primado da Constituição e o Estado Democrático de Direito, praticando a tão necessária e almejada justiça fiscal”, afirmou.

O debatedor Igor Mauler Santiago, advogado e membro da Comissão Especial da OAB, frisou que, nos 30 anos da Constituição, a jurisprudência do STF mudou, inclusive com alteração de atitude e metodologia, perante o sistema constitucional tributário. “Num primeiro momento, a postura do STF ante às regras era reverente, de aplicação estrita, invalidando pretensões tributárias que se afastavam delas. Hoje, a postura quanto às regras é menos reverente: vê nelas o que quer ver, não o que se pode extrair a partir da hermenêutica filosoficamente justificada. Não se conseguiu chegar a uma prática interpretativa consistente com o sistema que se extrai da Constituição”, afirmou. Breno Dias de Paula presidiu os trabalhos.

Contribuinte no texto constitucional 

O quarto painel abordou os direitos do contribuinte na prática constitucional desde 1988. O membro honorário vitalício da Ordem, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, presidiu a mesa, que teve como palestrante Lênio Streck e como debatedor Gustavo Amorim, membro da Comissão Nacional de Direito Tributário da OAB.

 Streck iniciou sua apresentação elogiando a Constituição e criticou o tratamento que a ela é destinado. “Perdeu-se a capacidade mínima de ler ‘x’ onde está escrito ‘x’. Em tom de brincadeira, costumo dizer que o professor de direito constitucional é quase um subversivo nos dias atuais”, apontou.

 Ele também avaliou o papel do Supremo Tribunal Federal (STF) enquanto fórum constitucional e os debates que ali têm sido travados. “Ainda usamos argumentos como voz das ruas e sentimento social para justificar que valham mais do que uma constituição normativa. Em um estado democrático, a realidade paga tributo à força da norma”, avaliou.

Economia no texto constitucional

Palestrante do Painel 5, o advogado Marco Aurélio Greco falou sobre tributação e economia na Constituição de 1988. Segundo ele, a tributação no Brasil hoje ainda é basicamente fruto de um modelo concebido na década de 1950. Greco afirmou que em lugar de se gastar energia na tentativa de realizar uma grande reforma tributária é preciso pensar o tema sob outra estratégia.

“Ao invés de pensar em reforma constitucional para mexer em competências, vamos pensar em reformas eventualmente pontuais para mudar o mecanismo de cumprimento das obrigações. Por que não estendemos o mecanismo do SIMPLES em função de determinados setores? Por exemplo, um SIMPLES da tecnologia, ou agropecuário, ou financeiro. Ou seja, ao invés de ficarmos batendo na mesma tecla sobre a necessidade de mudar o ICMS ou outro imposto, vamos discutir o modo do contribuinte cumprir sua obrigação. A competência você melhora eventualmente se for possível. Enquanto isso, vamos pensar naquilo que atinge diretamente o contribuinte. O rateio é problema do poder público, não do contribuinte”, disse ele.

Justiça x Tributação

A ministra do Superior Tribunal de Justiça, Regina Helena Costa, proferiu a palestra do Painel 6 a respeito da Tributação e Justiça na Constituição de 1988. Ela criticou a tributação realizada no Brasil ao dizer que não há nenhuma sintonia entre a atividade tributadora do estado e a busca de justiça social. “São coisas que não dialogam, não há nenhuma conexão entre as duas coisas”, afirmou ela.

“Precisamos enxergar a tributação dentro de um contexto de busca da justiça social. Ou seja, é preciso abandonar a ideia de que tributo é apenas instrumento de arrecadação. De que é um expediente apenas para gerar receita para o estado e que, portanto, isto não tem nenhuma outra finalidade ou reflexo. É preciso entender que o tributo é instrumento de transformação social e que por meio da tributação é possível sim ajudar a promover a justiça social”, disse Regina Helena.

No contexto de uma visão de uso da tributação como instrumento de justiça social, o procurador especial de Direito Tributário do Conselho Federal, Luiz Gustavo Bichara, lembrou da distorção gerada pela falta de correção da tabela do Imposto de Renda. “A tributação está absolutamente desconectada da justiça social. E aqui lembro a luta da OAB pela correção da tabela do Imposto de Renda. Faz 20 anos que ela não é atualizada. Hoje, um cidadão que ganha mais do que R$ 1.903 é tributado. Diz o IPEA que se a tabela tivesse sido reajustada essa fatia seria de R$ 8.590. Então hoje tributamos os pobres com o Imposto de Renda. A OAB manejou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade sobre isso e esperamos que isso seja julgado logo, mas o fato é esse, faz 20 anos que não se atualiza essa tabela”, afirmou ele.

Tributação, finanças públicas e federalismo fiscal

 O último painel debateu a tributação e as finanças públicas no texto constitucional, e também o federalismo fiscal nas últimas três décadas. A conselheira federal Cléa Carpi (RS), agraciada com a Medalha Rui Barbosa, presidiu os trabalhos da mesa.

 Sobre a tributação no escopo da Constituição, falou o advogado Everardo Maciel. “Temos um quadro muito preocupante de crise fiscal. A dívida pública brasileira, de forma caótica, representa 88% do nosso Produto Interno Bruto, e crescendo. Os Estados se encontram em situação pré-falimentar, em virtude da contínua expansão dos gastos sem a contrapartida de aumento das receitas. Há uma reprodução exacerbada, no âmbito tributário, da índole analítica da Constituição”, alertou.

 O segundo tema – federalismo fiscal nas últimas três décadas – foi exposto pela advogada Misabel Derzi. “Somos um país de democracia intermitente, onde com a redemocratização o federalismo virou cláusula imperativa fundante da nossa Constituição. O texto constitucional que temos é o coroamento de uma distensão política. O verdadeiro federalismo reside na uniformização rígida de um país para que as desigualdades sejam minimizadas”, apontou. 

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OAB emite nota contra ato do MEC que abriu milhares de vagas em cursos de Direito

Brasília – O presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, emitiu nesta quarta-feira (16), nota contra ato do Ministério da Educação que permitiu a abertura de novos cursos de Direito, somando mais de cinco mil novas vagas para a graduação. Confira:

"A sociedade brasileira novamente é atacada pelo MEC, que mais uma vez autoriza a abertura de milhares de vagas em cursos de Direito, sem que uma avaliação profunda das mesmas seja feita, permitindo assim que o estelionato educacional se perpetue em nosso país.

Aos olhos da sociedade, a abertura de vagas dá a falsa impressão de que haja um positivo avanço social rumo ao ensino superior de qualidade. Na prática, o que ocorre é bem diferente. São milhares de jovens estudantes e famílias inteiras lesadas pela baixíssima qualidade de cursos criados sem levar em conta critérios básicos como a necessidade social e a estrutura mínima para receber os discentes, além da falta de capacidade do mercado para recepcionar os alunos nas atividades de práticas jurídicas.

A ampliação da oferta de vagas – uma valiosa moeda de troca, especialmente em período pré-eleitoral - fragiliza a boa formação dos alunos, o que resulta na enxurrada de profissionais diplomados e muitos sem condições de enfrentar a realidade de um mercado de trabalho competitivo ou mesmo de habilitar-se ao exercício da advocacia.

O MEC precisa urgentemente adotar critérios de maior responsabilidade e fiscalização, para que os alunos deixem de ser vítimas de um verdadeiro estelionato, promovido por algumas instituições cujo interesse passa longe da qualidade da formação, mas prioritariamente pelo lucro”.

Claudio Lamachia, presidente nacional da OAB

Artigo: O estelionato educacional

Brasília - O Jornal de Santa Catarina publicou na sua edição de segunda-feira (14), o artigo "O estelionato educacional", de autoria do conselheiro federal da OAB, Tullo Cavallazzi. Confira abaixo a íntegra:

O estelionato educacional

Por Tullo Cavallazzi Filho, advogado, conselheiro federal e ex-presidente da OAB-SC

A velocidade com que o Ministério da Educação (MEC) vem autorizando a abertura indiscriminada de novos cursos de Direito em todo o Brasil merece uma atenção especial da Advocacia e da sociedade. Somente em 2018 já foram mais de 11 mil vagas abertas. Assim, o país atinge a incrível marca de 1.300 curios de Direito, segundo informações oficiais do MEC. Esse número impressiona ainda mais quando comparado ao número de faculdades de Direito existentes no resto do mundo. Nos Estados Unidos e Europa, por exemplo, são cerca de 1.100 cursos de Direito ao todo, contra 1.300 somente no Brasil!

O quantitativo leva, inexoravelmente, ao ingresso de um considerável número de profissionais no mercado da advocacia. Segundo os dados do Cadastro Nacional de Advogados (CNA), já são mais de 1 milhão de profissionais inscritos na instituição. Precisamente, 1.083.114 advogados dividem hoje o mercado de trabalho brasileiro. A OAB vem constantemente denunciando o descaso do Ministério que, de forma irresponsável, tem autorizado a abertura de novos cursos, contrariando pareceres emitidos pela Ordem, "sem levar em consideração a qualidade de ensino, a necessidade social e a estrutura mínima para receber os prováveis discentes, tais como a capacidade do mercado de recepcionar os alunos nas atividades de práticas jurídicas". (Nota emitida recentemente pela OAB Nacional).

Nossa preocupação decorre não só do elevado número de profissionais, mas, sobretudo, da falta de qualificação para o enfrentamento de um mercado tão competitivo e de elevada responsabilidade. Preocupa-nos, também, que esteja em curso o denominado "estelionato educacional", em que o maior prejudicado é o próprio bacharel, falsamente enganado por instituições que só vislumbram o lucro em detrimento do ensino qualificado.

Assim sendo, são necessárias drásticas medidas: a interrupção imediata na abertura de novos cursos de Direito e a colocação em prática de um duro sistema de fiscalização de cursos. Só assim a sociedade e a advocacia brasileira poderão ter, num futuro próximo, um ensino jurídico seguro e de qualidade.

Lamachia recebe Bernardo Cabral e Mauro Benevides

Brasília – O presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, recebeu nesta quarta-feira (16), o ex-presidente da OAB nacional, Bernardo Cabral e o ex-vice-presidente da Assembleia Nacional Constituinte de 1987, Mauro Benevides.

Com longa trajetória dedicada a advocacia e a política, Bernardo Cabral presidiu o Conselho Federal da OAB entre os anos de 1981 a 1983. Lamachia destacou a importância da gestão de Cabral, especialmente num momento conturbado, que antecedeu o fim da ditadura militar. “A atuação de Bernardo Cabral foi exemplar e emblemática”, destacou o presidente.

Durante a sua presidência ocorreu um dos mais emblemáticos episódios da história nacional, que foi o atentado ao Riocentro, em 30 de abril de 1981. Na ocasião, Bernardo Cabral, presidiu reunião no Congresso Nacional - juntamente com o presidente da Associação Brasileira de Imprensa - ABI, Barbosa Lima Sobrinho - para, com os líderes dos partidos políticos, requerer à presidência da República a apuração dos fatos relativos à explosão que ocasionou a morte de um militar e ferimentos graves em um oficial do exército. 

Lamachia também saudou a atuação de Mauro Benevides, que teve papel fundamental para a concepção da Constituição Federal de 1988, além de ressaltar a atuação do parlamentar durante o impeachment do então presidente Fernando Collor, período em que Benevides presidiu o Senado Federal.