O Globo: OAB rebate críticas de número dois da PGR aos advogados que atuam como juízes eleitorais

Brasília – O jornal O Globo destacou, nesta segunda-feira (14), as críticas do presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, ao parecer do vice-procurador-geral da República, Luciano Mariz Maia, que questionou a imparcialidade de advogados que atuam como juízes eleitorais.

Leia abaixo a íntegra na matéria ou acesse-a no site do jornal O Globo.

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OAB rebate críticas de número dois da PGR aos advogados que atuam como juízes eleitorais

Para presidente da entidade, Maia deveria se preocupar mais com quem infringe a lei

BRASÍLIA - A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) rebateu parecer do vice-procurador-geral da República, Luciano Mariz Maia, com duras críticas à Justiça Eleitoral. Segundo Maia, os advogados que atuam como magistrados nas cortes eleitorais não são tão imparciais quanto os juízes de carreira, o que prejudicaria a análise de processos criminais mais complexos, como os atos de lavagem de dinheiro investigados na Operação Lava-Jato. Para a OAB, Maia deveria se preocupar mais com quem infringe a lei, citando como exemplo os benefícios que fazem procuradores ganharem mais do que o teto constitucional, hoje em R$ 33.763 mensais.

Os sete integrantes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e dos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) são trocados periodicamente. Cinco deles são oriundos de outros órgãos do Judiciário, e dois são advogados. O problema maior, entende Maia, são justamente os advogados, que, apesar da nova função, não são proibidos de continuar exercendo a profissão, desde que não assumam processos eleitorais.

"A Constituição define a composição dos tribunais com representação de todas as funções essenciais à Justiça para, justamente, dar mais eficiência ao sistema e tornar mais eficientes os filtros contra eventuais vícios e equívocos. A advocacia é indispensável à realização da Justiça e, como tal, precisa ser respeitada e ter suas prerrogativas observadas. O vice-procurador-geral eleitoral deveria estar mais preocupado com a correção de situações que contrariam a lei, como é o caso dos salários acima do teto e dos auxílios ilegais pagos a algumas carreiras", diz nota assinada pelo presidente da OAB, Claudio Lamachia.

O parecer de Maia é uma resposta ao ex-ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços Marcos Pereira. Ele é alvo de um inquérito baseado na delação da Odebrecht que apura a suposta compra de apoio político de partidos para apoiar a candidatura de Dilma Rousseff à Presidência da República em 2014. Na época, ele comandava o PRB, legenda que fez parte da coligação de Dilma. Quando Pereira deixou o cargo no governo federal e perdeu o foro privilegiado no STF, o ministro Edson Fachin mandou o inquérito para o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), com sede em São Paulo. Pereira, que nega irregularidades, recorreu e pediu que o processo fosse enviado à Justiça Eleitoral do Distrito Federal, mas não houve decisão ainda.

“Há, ainda, que se questionar se seria conveniente, desejável, e, até mesmo, compatível com a Constituição, permitir-se que advogados em pleno exercício da advocacia possam emitir juízos decisórios em sede de investigações ou ações penais que tratem desse tipo de crime", escreve Maia, que ainda diz: "isso significa que, caso se entenda que a competência penal da Justiça Eleitoral abrange crimes comuns federais, ter-se-á um cenário em que advogados, e não juízes, serão os responsáveis por processar e julgar esses crimes”.

Maia também afirmou que a Justiça Eleitoral não está preparada para julgar processos criminais complexos como os da Operação Lava-Jato, em especial neste ano, quando suas atenções estarão voltadas para as eleições de outubro.

Apesar da preferência pela Justiça comum, a posição da Procuradoria-Geral da República (PGR) não é de evitar a remessa de processos às cortes eleitorais. Na avaliação do órgão, investigações como a do ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin, acusado de receber milhões da Odebrecht via caixa dois, devem seguir para a Justiça Eleitoral porque tratariam exclusivamente de crimes eleitorais. Foi o próprio Maia quem fez esse pedido ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Procuradores do âmbito da Lava-Jato em São Paulo, no entanto, discordam do vice-procurador e entendem que a investigação de Alckmin também deveria ser analisada pela Justiça comum.


Folha de S.Paulo: Limite para foro especial é uma boa solução, por Claudio Lamachia

Brasília – O jornal “Folha de S.Paulo” publicou neste sábado (12) artigo do presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, sobre a recente decisão do Supremo Tribunal Federal de limitar o foro por prerrogativa de função, o chamado foro privilegiado. No texto, Lamachia, afirma que o julgamento “tem como efeito positivo imediato a busca efetiva da eliminação das regalias que aumentam a distância entre essas autoridades e as cidadãs e os cidadãos que não exercem cargos eletivos nem altas funções públicas”. Leia o artigo completo abaixo.

O limite imposto pelo Supremo Tribunal Federal para o foro especial é uma boa solução? SIM

Por Claudio Lamachia, presidente nacional da OAB

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de restringir as possibilidades de uso do foro por prerrogativa de função —o famigerado foro privilegiado— por deputados e senadores tem como efeito positivo imediato a busca efetiva da eliminação das regalias que aumentam a distância entre essas autoridades e as cidadãs e os cidadãos que não exercem cargos eletivos nem altas funções públicas.

Trata-se de uma decisão plenamente consonante com os valores republicanos descritos na Constituição, que é clara ao estabelecer que todos são iguais perante a lei.

Outro resultado benéfico é o descongestionamento do próprio STF, cuja missão principal é se dedicar às grandes e relevantes questões constitucionais, mas que acaba travado por questões menores do cotidiano dos políticos em decorrência do benefício desfrutado pelos que só podem ser julgados pelo mais importante tribunal do país —e não pela Justiça comum.

Uma das qualidades da Constituição em vigor é, justamente, permitir que o direito e as estruturas estatais evoluam junto com a sociedade para bem atendê-la —e não se servirem dela. Cabe aos três Poderes da República estarem em compasso com essa aspiração.

Apesar das divergências sobre os limites de atuação do STF, criando novas regras via interpretação, não se pode negar que o debate provocado pela recente decisão impulsiona o Congresso a tomar para si o tema do foro e cumprir sua vocação, normatizando os avanços necessários para a garantia de um Estado republicano.

Além dos deputados e senadores, com foro no STF, diversas outras funções dão direito a tratamento especial nos demais tribunais, como o Superior Tribunal de Justiça e os Tribunais de Justiça, que também ficam sobrecarregados. É o caso dos governadores, deputados estaduais, juízes e membros do Ministério Público, entre outros.

O instrumento, muitas vezes, acaba blindando políticos e funcionários públicos contra desvios praticados sem nenhuma relação com o cargo ou a instituição que deveriam representar.

O foro especial foi criado para proteger as instituições e não seus ocupantes temporários. Ele perdeu o sentido ao ser estendido para milhares de indivíduos. A concessão indiscriminada do benefício fica evidente pela falta de consenso sobre o número de agraciados —as estimativas variam entre 50 mil e 60 mil pessoas dotadas de algum tipo de foro. Não existem, no país, tantas funções sensíveis ou estratégicas para a continuidade do Estado de Direito.

A decisão do STF aumenta a responsabilidade do Legislativo em produzir os textos legais capazes de sanar o problema. A Câmara e o Senado são os espaços adequados para que a questão seja resolvida de modo sólido e duradouro.

Ao debater a questão, em 2017, o plenário do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) chegou à conclusão de que o foro privilegiado deveria ser readequado aos seus propósitos originais por meio de proposta de emenda constitucional. É preciso restringir de forma drástica a quantidade de beneficiados.

Esse grupo deveria ser composto, por exemplo, apenas por chefes de Poderes e de alguns órgãos estratégicos, nos três níveis da administração. Cabe ao Congresso avaliar o contingente de pessoas beneficiadas e fazer as distinções necessárias.

Do mesmo modo, a OAB tem chamado a atenção para a existência de outras regalias decorrentes de distorção da lei e que agravam a crise enfrentada pelo país.

É o caso, por exemplo, da concessão indiscriminada de veículos oficiais, das viagens com fins privados em aviões públicos, de salários que extrapolam o teto e de auxílios ilegais, os chamados "penduricalhos" de que gozam alguns altos cargos públicos. São todos problemas da mesma natureza e que pedem solução urgente.